Resiliência

Há mais de quarenta anos, a ciência tem-se interrogado sobre o fato de que certas pessoas têm a capacidade de superar as piores situações, enquanto outras ficam presas nas malhas da infelicidade e da angústia que se abateram sobre elas como numa rede engodada.

Por que certos indivíduos são capazes de se levantar após um grande trauma e outros permanecem no chamado
fundo do poço, incapazes de, mesmo sabendo não ter mais forças para cavar, subir tomando como apoio as paredes desse poço e continuar seu caminho?

As experiências e estudos feitos têm mostrado algumas explicações científicas sobre esse fato. A biologia defende o ponto de vista de que cada ser humano é dotado de um potencial genético que o faz ser mais resistente que outros. A psicologia, por sua vez, dá realce e importância das relações familiares, sobretudo na infância, que construirá nesse individuo a capacidade de suportar certas crises e de superá-las. A sociologia vai fazer referência à influência do entorno, da cultura, das tradições como construtores dessa capacidade do individuo de suplantar as adversidades.

A teologia traz um aporte diferente pela própria subjetividade transcendente, uma visão outra da condição humana e da necessidade do sofrimento como fator de evolução espiritual: o célebre “dar a outra face”.

Mas foi o cotidiano das pessoas que passam por traumas, que realmente atravessam o vale das sombras, o que realmente atraiu a curiosidade de cientistas do mundo inteiro. Não são personagens de ficção que se erguem após a grande queda; são homens, mulheres, crianças, idosos, o individuo comum do mundo que retoma sua vida após a morte de um filho, a perda de uma parte de seu corpo, a perda do emprego, doenças graves, físicas ou psíquicas, em si mesmo ou em alguém da família, razões suficientes para levar um individuo ao caos.

Esses que são capazes de continuar uma vida de qualidade, sem auto-punições, sem resignação destruidora, que renascem dos escombros, esses são seres resilientes.

A resiliência é um termo oriundo da física. Trata-se da capacidade dos materiais de resistirem aos choques. Esse termo passou por um deslizamento em direção às ciências humanas e hoje representa a capacidade de um ser humano de sobreviver a um trauma, a resistência do individuo face às adversidades, não somente guiada por uma resistência física, mas pela visão positiva de reconstruir sua vida, a despeito de um entorno negativo, do estresse, das contrições sociais, que influenciam negativamente para seu retorno à vida.

Assim, um dos fatores de resiliência é a capacidade do individuo de garantir sua integridade, mesmo nos momentos mais críticos.

Não se é resiliente sozinho, embora a resiliência seja íntima e pessoal. Um dos fatores de maior importância é o apoio e o acolhimento, feito em geral por um outro individuo, e essencial para o salto qualitativo que se dá. Alguns autores nomearam essas pessoas: Flash chamou-o mentor de resiliência; Cyrulnik chamou-o tutor de resiliência; muito antes Bolwby chamou-o figura de apego. Denominações a parte, a resiliência ganha hoje seu espaço na pesquisa em ciências humanas, médicas, sociais, administrativas, dentre outras.

Mas não se forma um mentor/tutor/figura de apego.

Não se pode dizer que alguém vai ser a partir de agora esse individuo que vai chegar para operar o milagre. A resiliência é, na verdade, o resultado de intervenções de apoio, de otimismo, de dedicação e amor, idéias e conceitos que entram sorrateiramente nas ciências como causa e efeito, intervenção e resultado, hipótese e tese de que as relações intra e interhumanas são relações que ultrapassam o rigor do empirismo para encontrar o acaso.

O conceito de Resiliência não tem sido muito difundido no Brasil em estudos ou produções acadêmicas, embora que na Europa e em certa medida, também na América do Norte exista um número bastante considerável de estudos que o incluem.

Considerando que, dado o seu potencial, é um conceito que pode ser muito significativo para a área da Educação e da Psicologia da Educação, no Brasil.

Com freqüência os meios de comunicação nos informam sobre os altos níveis de ansiedade, estresse, tensão que sofrem os seres humanos na atualidade. Ultimamente as depressões os sofrimentos similares, afetam cada dia mais as pessoas.

Os problemas econômicos, de saúde, familiar ou profissional, estão na lista de fatores que incidem diretamente nas condutas negativas de ruína dos indivíduos. As decepções geradas pela incapacidade de resolver as contradições conduzem o indivíduo ao sentimento de impotência diante as adversidades que lhe são impostas.

Estes desafios e dificuldades que cotidianamente se apresentam para os seres humanos, onde a concorrência e a procura por espaços profissionais e pessoais se tornam ainda mais acirradas, onde as perspectiva externas se chocam com as probabilidades reais de realização do sujeito. Este precisa ser formado e se autoformar, para se preservar psicologicamente, para reagir e organizar o seu mundo, suas indigências, suas prioridades, seus anseio e suas ações, de modo a não deixar sobrepujar por contingências e conjuntura a que não possa, em dado momento e em determinadas situações, controlar e dar respostas exigidas.

Esta formação neste contexto exprimiria a sua resiliência, isto é, sua capacidade de responder de forma mais consciente aos desafios e dificuldades, de reagir com flexibilidade e capacidade de recuperação diante destes desafios e circunstancias desfavoráveis, tendo uma atitude otimista, positiva e perseverante, mantendo um equilíbrio eficaz durante e após os embates.

Um atributo de personalidade que, ativada e desenvolvida, possibilita ao sujeito superar-se e às pressões de seu mundo, desenvolver um autoconceito realista, autoconfiança e um senso de autoproteção que não desconsidera a abertura ao novo, à mudança, ao outro e à realidade subjacente.

Devemos levar em conta que a resiliência é uma capacidade inata para fazer as coisas corretamente, para transformar comportamentos e impetrar trocas. Portanto, poderíamos dizer que todos somos resilientes, pois há condições e fatores que transformam circunstâncias de pressão, hostilidade e se tornam em um aspecto que nos faça seguir adiante.

Pode-se refletir que a resiliência tem a ver com o vínculo afetivo de cada dinâmica familiar ou social.

Necessita-se que sejamos queridos e que possamos contar com pessoas que nos satisfaçam quanto às necessidades básicas e que nos façam sentir únicos, úteis e importantes.

Afrontar com situações muito difíceis provoca crises na pessoa e em seu grupo familiar: doenças graves de familiares próximos, separação ou morte dos pais, desemprego, miséria, a vida numa comunidade violenta (crianças que presenciam assassinatos, que foram assaltadas ou seqüestradas), perdas significativas (perder pessoas queridas, perder a casa em conseqüência de incêndio, inundação ou deslizamento, ter que sair do país como refugiado).

Situações de vida como essas são potencialmente traumáticas. No entanto, as pessoas resilientes conseguem "atravessar" esses períodos complexos sem se desestruturar, como uma árvore flexível cujos galhos se dobram num vendaval, mas não se quebram. As crises representam um enorme desafio: é essencial ter flexibilidade para instituir novas soluções para as dificuldades que surgem, ter determinação e força para enfrentar os problemas, saber buscar e solicitar auxílio hábil.

Os profissionais que pesquisam os "ingredientes básicos" da resiliência articulam que esta força interior é, em parte, inata: há pessoas que, por herança genética e por temperamento são mais resilientes que outras. No entanto, a resiliência também pode ser desenvolvida no transcorrer da vida, especialmente durante a infância e a adolescência: para isto, é basilar que os adultos importantes para a criança e para o jovem tenham sabedoria para escutá-los e compreender o que sentem ante as circunstâncias que enfrentam; encorajem a expressão dos sentimentos de tristeza, raiva e medo; ofereçam o apoio indispensável para que eles se sintam seguros, conquanto incentivem sua independência e iniciativa para criar saídas e soluções para os problemas.

Desta maneira, a autoestima sai fortalecida e a resiliência aumenta: em vez de se sentir traumatizada e derrotada pela vida, o indivíduo se sente mais competente para afrontar os desafios inerentes às crises. Assim sendo, a qualidade do auxílio proporcionado e do relacionamento que se desenvolve são "ingredientes" indispensáveis para o desenvolvimento da resiliência.

Recusar que a resiliência é um fenômeno que pode ser promovido é ignorar todos os estudos alusivos ao comportamento humano que oferecem extrema acuidade ao meio em que os indivíduos vivem e privilegiar o senso comum fundamentado na premunição e no destino.

É acreditar que cada um ao nascer já trás consigo toda a sua trajetória histórica definida. Partindo desta pressuposição, nenhuma tática poderia influenciar o indivíduo a transformar a sua realidade.

Costa (2000) é um dos estudiosos que acredita que a resiliência não é privilégio de alguns exclusivamente. Não é o episódio de uns nascerem resilientes e outros não.

O estudo sistemático da resiliência nas pessoas e nas organizações revelou que ela não é uma qualidade única e extraordinária, característica intransferível de um grupo especial de pessoas.

Não.

A resiliência é antes de tudo a resultante de qualidades comuns que a maioria das pessoas já possui, mas que precisam estar corretamente articuladas e suficientemente desenvolvidas.

Promover, deste modo, a resiliência em um grupo, incidi em conhecer a sua história, procurar analisá-lo no contexto, para então interferir de maneira apropriada, indagado as razões capazes de motivá-lo e fortificá-lo.


COMO DESENVOLVER E/OU AUMENTAR A RESILIÊNCIA

O Dr. Alberto D’Auria fornece as seguintes orientações:

- Mentalizar seu projeto de vida, mesmo que não possa ser colocado em prática imediatamente. Sonhar com seu projeto é confortante e reduz a ansiedade;
- Aprender e adotar métodos práticos de relaxamento e meditação;
- Praticar esporte para aumentar o ânimo e a disposição;
- Procurar manter o lar em harmonia, pois isto representa “o ponto de apoio para recuperar-se”;
- Aproveitar parte do tempo para ampliar conhecimentos, pois isto aumenta a autoconfiança;
- Assumir riscos (ter coragem), pois não adianta brigar com os problemas mas enfrentá-los para não ser destruído por eles;
- Tornar-se um(a) “sobrevivente” repleto(a) de recursos no mercado de trabalho;
- Usar a criatividade e a imaginação para quebrar a rotina e mudar seus hábitos para resolver situações imprevistas, adversas e delicadas;
- Transformar-se em um otimista incurável, visualizando sempre um futuro bom e melhor;
- Apurar o senso de humor (desarmar os pessimistas);
- Separar bem quem você é, e o que você faz;
- Permitir-se sentir dor, recuar e, às vezes, enfraquecer para, em seguida, retornar ao seu estado original.


VANTAGENS

O desenvolvimento da resiliência pode proporcionar ao ser humano as seguintes vantagens:

- Permitir nossa reciclagem pessoal através da renovação de nossas energias e da reintegração ou ajustamento à uma nova realidade;
- Fornecer a oportunidade de curar velhas feridas;
- Descobrir novas formas de lidar com a vida e de nos organizarmos de modo mais eficaz;
- Melhor preparação para lidarmos com pressões;
- Fornecer meios de reduzir pressões desnecessárias, reconhecendo como são criadas e mantidas;
- Desenvolver a capacidade que cada um tem de se adequar e flexibilizar às situações sem perder seus objetivos.

A resiliência fortalece o desempenho mantendo as habilidades e competências necessárias para que o indivíduo continue seu aprendizado, seu desenvolvimento e ascensão de sua carreira profissional.

CARACTERÍSTICAS DA PESSOA RESILIENTE

Para Frederic Flach, as características da pessoa resiliente são:

- Capacidade de aprender;
- Auto-respeito;
- Criatividade na solução de problemas;
- Habilidade em recuperar a auto-estima quando diminuída ou temporariamente perdida;
- Independência de espírito: autonomia;
- Liberdade e interdependência.